
A divergência sobre o escopo do projeto de lei que prevê a anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 pode fazer com que a oposição tenha que buscar maneiras de driblar a intenção do atual relator da matéria, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), de restringir o projeto a uma diminuição de penas. Há alternativas regimentais e articulações políticas que podem ser utilizadas para fazer com que o projeto volte à forma original de anistia ampla, geral e irrestrita.
Designado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), o relator Paulinho da Força já deixou claro que deve focar na redução das penas (“dosimetria”), evitando um perdão amplo e irrestrito. Ele ainda tenta costurar um acordo com lideranças partidárias e com o Senado e por isso ainda não divulgou seu relatório. Assim, a votação não deve ocorrer nesta semana.
A primeira alternativa da oposição para tentar obter uma anistia ampla e irrestrita deve ser utilizar os chamados destaques e emendas de plenário para trazer pontos da proposta original quando a votação acontecer. Esses recursos regimentais permitem que, por meio de votação, os deputados consigam reintroduzir trechos que o relator porventura venha a descartar na redação que der à matéria ou inserir pontos novos – como a própria anistia, se ela não for incluída no texto por Paulinho da Força.
Nos bastidores, parlamentares de oposição apontam que, mesmo sem ajustes no texto, será difícil votar contra a proposta relatada por Paulinho da Força, já que diminuir as penas dos condenados já seria um avanço.
Mesmo em caso de derrota da anistia ampla, geral e irrestrita, a oposição pode seguir com o tema, utilizando alternativas regimentais para manter a busca pela aprovação da proposta original de anistia geral.
Para o cientista político Luiz Jardim, a oposição dificilmente deixará o tema morrer. “A anistia acontecerá. Pode não ser neste momento, mas no futuro ocorrerá, principalmente devido à tradição histórica brasileira. Muitas anistias ocorreram”, analisa. Ele lembra que a chamada “carta na manga” da oposição está diretamente ligada à política eleitoral: caso um candidato oposicionista ao PT seja eleito e a correlação de forças no Legislativo mude, a aprovação de uma anistia ampla seria uma das primeiras medidas do novo governo.
A busca por projetos similares com requerimentos de urgência já aprovados, pautando novamente o tema por meio de pressão popular e articulação política, é uma das vias possíveis. Neste caso, uma das possibilidades é o projeto do ex-deputado Major Vitor Hugo (PL-GO), que prevê anistia a todos os que tenham participado de manifestações em qualquer lugar do território nacional desde o dia 30 de outubro de 2022.
Mesmo em curto prazo, Jardim também acredita que a oposição pode apresentar novos projetos alternativos para alcançar uma anistia geral. “Depois de boa articulação política, a oposição pode conseguir número para aprovar um projeto alternativo, que contemple a anistia para todos. Projetos alternativos surgem mesmo na véspera da votação”, afirma. Ele lembra que a própria aprovação da urgência do PL da anistia, com 311 votos favoráveis, demonstrou força suficiente para alterar a balança em plenário.
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Projetos similares podem ser retomados pela oposição
Em tramitação desde 2022, um dos projetos que pode ser retomado pela oposição é o do ex-deputado Major Vitor Hugo (PL-GO). Proposto no contexto pós-eleições de 2022 e antes dos atos de 8 de janeiro, a proposta anistiaria manifestantes, caminhoneiros, empresários e todos os que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional desde o dia 30 de outubro de 2022.
Nesse caso, também há mais de um caminho para retomar o debate. A oposição pode explorar a decisão da Presidência da Casa, de outubro de 2024, que designou uma comissão especial para discutir a proposta. Na época, a decisão foi considerada uma manobra do então presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), já que com isso ele impediu a aprovação da proposta na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), que tinha maioria para aprová-la.
Além disso, há espaço para retomar um requerimento de urgência já aprovado que levaria a proposta para votação direto no plenário.
Há ainda a chance de pautar o projeto em uma Sessão Extraordinária Virtual no plenário da Câmara, com deliberação imediata e exclusiva da matéria. Para que essa sessão aconteça, é necessária a votação de um requerimento, que deve contar com o apoio da maioria simples dos deputados. Essa alternativa chegou a ser apresentada pela então líder da minoria deputada Caroline De Toni (PL-SC) em julho, durante o recesso parlamentar. A estratégia, no entanto, não foi acolhida pelos demais parlamentares de oposição, que preferiram partir para a obstrução, com a ocupação do plenário da Câmara.
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Anistia pode ter que esperar pelo resultado das eleições de 2026
Apesar da possibilidade de manter o tema da anistia em debate por meio de recursos regimentais, a avaliação nos bastidores da oposição é de que não deve haver outro momento político favorável para isso nesta legislatura do Congresso Nacional e sob o atual governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), segundo dois parlamentares do PL que falaram com a reportagem mas pediram para não ter seus nomes revelados.
No atual cenário, mesmo que uma proposta que contemple a anistia almejada pela oposição seja aprovada na Câmara, ainda haverá o obstáculo do Senado a ser superado. Com boa parte dos senadores contrários à concessão da anistia, o fim pode ser o mesmo da chamada PEC da Imunidade, que acabou enterrada no Senado após aprovação na Câmara.
Na avaliação do doutor em Ciência Política, Paulo Kramer, os políticos do Centrão, “interessados em aprovar a PEC apenas para reforçar sua impunidade” e os políticos da direita “dispostos a trocar o apoio à PEC pela vitória do PL da Anistia, acabaram comprometendo a imagem da luta pela libertação dos presos políticos do 8 de janeiro”. “Facilitou, mais uma vez, à esquerda mistificar e confundir a opinião pública. A política, definitivamente, não é uma ciência exata”, pontuou Kramer.
A esperança maior é que diante de uma nova composição do Congresso formada após as eleições de 2026, especialmente do Senado, a direita consiga retomar o tema. Pela Constituição Federal, a anistia só pode ser concedida pelo Congresso Nacional, via lei aprovada por maioria absoluta.
Além da anistia, o ordenamento jurídico brasileiro também contempla a figura do indulto, que, diferentemente da anistia, é de competência exclusiva do presidente da República. O indulto pode extinguir ou reduzir penas, sendo frequentemente concedido em datas comemorativas, como o chamado “indulto natalino”. Nesse caso, trata-se de uma decisão discricionária do Executivo, sem necessidade de aprovação legislativa. Sendo assim, outra possibilidade é o caso da eleição de um presidente de direita.
“Caso um candidato oposicionista ao PT seja eleito e, por consequência, o Poder Legislativo tenha maioria desta atual oposição, uma das primeiras medidas do governo será encaminhar uma proposta de anistia”, aponta o cientista político Luiz Jardim, que reforça ainda que essa é uma tendência reforçada pela tradição histórica brasileira de concessão de anistias em momentos de transição de poder.
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