
A decisão de abril do Supremo Tribunal Federal (STF) na chamada “ADPF das Favelas”, que impôs regras para as operações policiais nos morros do Rio de Janeiro, também determinou que a Polícia Federal (PF) se empenhasse no enfrentamento das facções criminosas que atuam no estado.
A corporação, porém, não informou detalhes do que tem sido feito até o momento para desmantelar essas organizações. O diretor-geral, Andrei Rodrigues, respondeu à imprensa, de forma evasiva, que a PF criou um “grupo de trabalho”.
Desde terça-feira (28), quando as polícias civil e militar fluminenses deflagraram a Operação Contenção, para prender lideranças e apreender fuzis do Comando Vermelho nos complexos do Alemão e da Penha, autoridades federais têm se esquivado quando questionadas sobre o motivo de não atuação da PF no caso.
O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, tem dito que a responsabilidade no caso é do estado e que uma atuação federal só seria possível por meio de uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Nesse caso, as Forças Armadas assumiriam a segurança pública mediante um pedido do governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro (PL), que admitisse a incapacidade das polícias estaduais no combate às facções.
Castro informou que pediu ao governo federal veículos blindados das Forças Armadas para derrubar as barricadas que os criminosos montam para delimitar territórios, o que foi negado. Lewandowski e outros ministros têm criticado o governo do Rio pelos 121 mortos na operação – incluindo quatro policiais –, sob o argumento de que o combate às facções deve se concentrar em ações de inteligência, na prisão de lideranças e no asfixiamento financeiro.
“Não basta a força bruta, a força física. O enfrentamento se faz com inteligência, com planejamento e com coordenação de ações das diversas forças”, disse Lewandowski em entrevista à imprensa nesta quarta (28), em Brasília. Deu como exemplo a Operação Carbono Oculto, deflagrada em agosto pela PF e polícias de São Paulo, que prendeu criminosos do PCC infiltrados no setor financeiro e de combustíveis. “Sem o disparo de um tiro, desbaratamos quadrilhas importantes”, disse Lewandowski, destacando a atuação conjunta, com participação também da Receita Federal, Coaf e Ministério Público Federal.
A seu lado, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, admitiu que a superintendência da corporação no Rio foi contactada pela Polícia Militar do Rio para colaborar na operação contra o Comando Vermelho, mas recusou. “Entendemos que não era o modo que a Polícia Federal atua, o modo de fazer operações”, disse.
“O colega do Rio de Janeiro informou o seu contato operacional que a Polícia Federal segue o seu trabalho de investigação, de polícia judiciária, fazendo o seu trabalho de inteligência, mas que naquela operação, que é do estado – tinha mais de 100 mandados, salvo engano para cumprir do estado do Rio de Janeiro –, nós não teríamos nenhuma atribuição legal para participar e, portanto, não fazia sentido a nossa participação”, disse Andrei Rodrigues.
Na entrevista, Lewandowski e Rodrigues lembraram que o STF mandou a PF investigar as facções do Rio de Janeiro, mas não deram detalhes do já que foi feito desde abril, quando a decisão foi proferida.
“Nós recebemos essa determinação da Suprema Corte e já estruturamos um grupo de trabalho que está atuando lá, nessa questão de atividade de inteligência, instauração de inquérito policial…”, disse Rodrigues, de forma evasiva, mencionando também a determinação para que o Coaf e a Receita Federal abasteçam a PF com dados financeiros. “É assim que a Polícia Federal atua e é assim que nós já estamos atuando e no Rio de Janeiro”, afirmou o diretor-geral da PF.
A Gazeta do Povo questionou a PF, por meio de sua assessoria de imprensa e também pela Lei de Acesso à Informação, se e quando o inquérito foi instaurado, qual o efetivo mobilizado e quais avanços já ocorreram desde abril. Não houve resposta até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.
O que o STF mandou a PF investigar na ADPF das Favelas
No início de abril, quando realizou o julgamento final da ADPF das Favelas, o STF determinou que a Polícia Federal (PF) instaurasse um inquérito abrangente sobre a atuação das facções criminosas no Rio de Janeiro.
A apuração deve cobrir “indícios concretos de crimes com repercussão interestadual e internacional e que exigem repressão uniforme, bem como de graves violações de direitos humanos derivadas das organizações criminosas, suas lideranças e seu modus operandi, sobretudo movimentações financeiras”.
Houve ainda a determinação de que a PF montasse uma equipe com dedicação exclusiva, com a finalidade de atuação permanente e dedicada à produção de inteligência e à condução de investigações sobre a atuação dos principais grupos criminosos violentos em atividade no Estado e suas conexões com agentes públicos.
Além disso, a corporação deveria dar ênfase na repressão às milícias, aos crimes de tráfico de armas, munições e acessórios, de drogas e lavagem de capitais, “sem prejuízo da atuação dos órgãos estaduais em suas respectivas atribuições”.
Na prática, deveria adotar o que o governo federal agora defende: ações de inteligência para desbaratar as facções a partir da cúpula, cortando o dinheiro das lideranças.
Durante o julgamento, vários ministros cobraram atuação da PF no Rio de Janeiro.
Gilmar Mendes considerou um absurdo a naturalização do domínio de territórios pelas facções. “Essas questões deveriam ter uma supervisão muito forte da Polícia Federal, de setores do Ministério Público Federal”, afirmou.
“O fato de admitirmos e sabermos que determinada comunidade é do grupo A ou do grupo B fala por si sobre uma fragmentação territorial, um redesenho federalista, uma série de problemas que talvez devêssemos, pelo menos, ensaiar seu enfrentamento. Certamente a Polícia Federal disporia de condições, talvez, de mapear esses grupos. A União tem instrumentos – COAF, Receita Federal – para esse tipo de enfrentamento”, afirmou.
No julgamento, ele reconheceu que, sozinhas, as forças policiais do Rio de Janeiro não seriam capazes de enfrentar as facções. Para sanar essa dificuldade, não defendeu uma GLO, mas uma atuação mais contundente da PF.
“As autoridades locais, elas próprias, não dispõem de condições para enfrentar essa temática. Talvez tenhamos que roçar essa questão, vendo que muitas das questões podem ser investigadas pela Polícia Federal, que caiam na competência da Polícia Federal”, disse Gilmar Mendes.
Relator da ação, Edson Fachin foi quem propôs a instauração de inquérito na PF. Além disso, conseguiu apoio dos demais para obrigar a União a injetar dinheiro para a estrutura, equipamentos e pessoal necessários para montagem de uma força-tarefa.
Justificou a medida pela constatação de que criminosos de outros estados estavam migrando para o Rio de Janeiro e do envolvimento das facções no tráfico de drogas internacional.
“Este Inquérito deve buscar provas junto ao Coaf, à Receita Federal e à Sefaz/RJ, ficando determinada pelo STF a máxima prioridade para atendimento das diligências”, propôs depois Flávio Dino, o que também foi acatado pelos demais ministros.
Alexandre de Moraes também reforçou a necessidade de apoio da PF. “Há aqui, portanto, uma situação de evidente transestadualidade, ou mesmo transnacionalidade, que exige a repressão uniforme em todo o território nacional. A repercussão interestadual ou internacional das atividades dessas organizações reclama a atuação da Polícia Federal”, disse.
Moraes defendeu que o governo federal providenciasse para as polícias do RJ “recursos humanos, logísticos, tecnológicos e financeiros para atuação permanente e dedicada à produção de inteligência e condução de investigações sobre a atuação dos principais grupos criminosos violentos em atividade no estado”.
A ênfase, segundo Moraes, deveria estar “na repressão aos crimes de tráfico de armas, munições e acessórios, de drogas, de lavagem de capitais e de corrupção de agentes públicos e políticos, sem prejuízo da atuação dos órgãos estaduais em suas respectivas atribuições”.
O ministro assumiu nesta semana a relatoria da ADPF das Favelas, na qual o STF monitora o cumprimento das determinações de abril. Sua primeira providência no processo foi exigir informações do governo do Rio de Janeiro sobre a operação.
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