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Qual é a causa da crise nas artes?

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Qualquer pessoa com um mínimo de juízo percebe que a arte está em crise. É uma crise tão profunda que nem mesmo os seus defensores conseguem dizer, com clareza, o que pretendem chamar de arte. Seria toda e qualquer criação humana? Mas, se tudo é arte, nada é arte. Resta, então, a pergunta: o que é a arte e em que consiste sua crise?

Na Alemanha, quando a Estética surgiu como disciplina autônoma, buscou-se reunir a tradição greco-romana, reorganizá-la e atribuir ao termo “arte” o sentido que em grande parte ainda preservamos hoje, com a exceção dos movimentos revolucionários.

A arte passou a ser entendida como uma atividade ordenada do espírito humano, que exige tanto conteúdo quanto forma. Pela forma, ninguém escreve poesia, por exemplo, sem antes assimilar a métrica, a tradição e a estrutura do gênero, ainda que depois deseje criticá-las. Uma frase de efeito, pichada num muro sem técnica poética, pode até causar impacto, mas não se confunde com poesia; a arte não pode ser reduzida a um estado subjetivo ou a uma produção sem técnica. Ela também não é apenas expressão inteligente ou um sentimento intenso, mas uma obra que se coloca no mundo e se torna propriedade dele, transcendendo o “eu” do artista, tanto pelo que comunica de universal da condição humana ou da Natureza, quanto pela sua forma. Em última instância, é o esforço de elevar a experiência individual ao seu grau mais universal, por meio de uma obra criada com técnica, ordem e beleza.

Com o tempo, entretanto, os artistas passaram a valorizar cada vez mais a “criação pessoal”. Já não se viam como servidores da verdade ou da beleza, mas como gênios autossuficientes, encerrados em seu próprio mundo. A subjetividade passou a pesar mais do que o próprio objeto artístico. Quer um exemplo? Goethe sinaliza essa virada em Werther, quando o protagonista afirma: “Eu não era capaz de desenhar agora, nem um traço, e, no entanto, nunca fui tão bom pintor como nestes momentos.” A incapacidade de criar é paradoxalmente tomada como prova de sua sensibilidade artística, pois ele estaria dominado por fortes emoções. O critério de consagração deixa de ser a obra e passa a ser a intensidade psíquica. Já não importa o que se produz, mas o que se sente. Nesse ponto, a arte perde seu caráter de via de acesso ao que transcende o ego do artista e retrata algo como a toda alma humana. Deixa de ser ponte para dramas universais e degrada-se em subjetivismo, num culto à própria sensibilidade e genialidade.

Perto dos anos 60 o problema se agrava: o chamado “sentimento artístico” emancipa-se, por natureza e não por acidente, da necessidade de qualquer obra concreta. Allan Kaprow, em O legado de Jackson Pollock, sintetiza essa mentalidade ao afirmar: “Os jovens artistas de hoje não precisam mais dizer ‘sou pintor’, ‘sou poeta’, ‘sou dançarino’. Eles são simplesmente ‘artistas’.” Em outras palavras, já não é preciso produzir nada; basta declarar-se. Daí a aberração: indivíduos que não compõem um único verso digno, não pintam um quadro, não fazem sequer uma escultura respeitável, se autoproclamam artistas apenas porque “sentem mais intensamente”, porque têm “uma psique mais sensível”. A produção de uma obra, a forma e o conteúdo tornam-se irrelevantes. O que importa é a subjetividade autoproclamada. Um exemplo ainda mais marcante é Marina Abramovic, cuja obra “The Artist is Present” consiste em quê? Em nada, absolutamente nada, senão em sentar-se, imóvel, diante do público. Nenhuma obra é produzida, mas “a artista está presente”.

E, para completar o espetáculo de inversões, a arte ainda se converte em política. Julio Le Parc declara em Guerrilha Cultural: “O interesse agora não está mais na obra de arte, com suas qualidades de expressão, de conteúdo etc., mas na contestação do sistema cultural. O que conta não é mais a arte, é a atitude do artista.” Eis a confissão: a obra cede lugar à militância. Por quê? Porque o militante seria, supostamente, mais sensível, mais crítico, mais livre do automatismo perceptivo. O foco deixa de estar na pintura, na dança ou na poesia, e se transfere para a agitação social, que substitui o belo pelo interessante ou pelo “disruptivo”.

A crise surge, então, como consequência inevitável desse subjetivismo e dessa politização da arte. O artista já não pode ser avaliado pela obra, mas pela sua “sensibilidade”, pela sua “autenticidade” ou, pior ainda, pela sua suposta “disruptividade”. O resultado é claro: a qualidade despenca e, muitas vezes, a própria obra desaparece. E as críticas? O artista está blindado, pois, à medida que escreve manifestos que justifiquem a unicidade do seu trabalho, todos os que o criticam são acusados de “não entender” daquele movimento. 

O que resta, então, é um esvaziamento generalizado, blindado contra qualquer crítica: no lugar de obras consistentes, de formas e trabalhos sólidos, proliferam o sentimentalismo barato e o exibicionismo do ego. Para quem tem um espírito sóbrio, isso não se chama vanguarda; chama-se decadência.

  • O relativismo não é capaz de explicar a beleza

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